30.3.11

KAMALOKA - PARTE 3/5

A primeira divisão, a mais inferior, encerra as condições que respondem aos diferentes gêneros de “infernos” descritos em tantos livros santos, indus e budistas. É preciso compreender bem que o homem, ao passar de um a outro destes estados purgatoriais, não fica realmente desembaraçado das paixões e dos desejos vis que o conduziram lá. Semelhantes elementos persistem, porque são parte integrante de seu caráter, mas ficarão latentes, em estado de germens, no mental, para surgirem e formarem sua natureza passional quando novamente estiver prestes a renascer no mundo físico.
A sua permanência na mais baixa região do Kamaloka deve-se exclusivamente à presença, em seu corpo karmico, de uma grande proporção de matéria pertencente a esta região e ai fica prisioneiro até que a camada, que se compõe dessa matéria, esteja suficientemente desagregada para permitir ao homem entrar em contacto com a região imediatamente superior.
A atmosfera deste lugar é sombria, pesada, triste, deprimente em grau inconcebível; parece impregnada de todas as influencias mais opostas ao bem. Tal é o seu caráter essencial, gerado por todos os que são conduzidos a este triste lugar por suas más paixões. Todos os desejos, tidos os sentimentos tórridos encontram ali materiais apropriados à sua expressão. Ali nada falta do que pode existir no lugar mais infecto, onde, entretanto, não se levam em conta todos os horrores que se ocultam à vista física e que ali se mostram em sua hedionda nudez.
O caráter repelente desta região é largamente acrescido pelo fato da forma, no mundo astral, se adaptar ao caráter. O homem presa de paixões repugnantes mostra, portanto, o aspecto exato do que é. Os apetites bestiais dão ao corpo astral um aspecto bestial, e as formas hediondas e terríveis, semi-humanas e semi-animais são a expressão mais adequada das almas que se tornam semelhantes aos brutos.
Ninguém, no mundo astral, pode ser hipócrita nem dissimular seus maus pensamentos sob o véu de aparências virtuosas. Tudo que o homem é, manifesta em sua forma e seu aspecto exterior; irradiando beleza quando seus pensamentos são nobres; asqueroso e repelente, quando sua natureza é vil. Compreender-se-á facilmente porque os Mestres, tais como Buda, de visão infalível, para quem todos os mundos estão abertos, puderam descrever o que viam nestes infernos, numa linguagem de um realismo terrível, que, por vezes, parece incrível aos leitores de hoje, porque esquecem que as almas uma vez libertadas da matéria pesada e pouco plástica do mundo físico, aparecem sob a forma que lhes corresponde, tendo exatamente o aspecto do que na verdade são. Mesmo neste baixo mundo, um facínora vil apresenta um aspecto repugnante; - que devemos pois esperar com a matéria astral mais plástica, que se adapta à maior impulsão dos desejos criminosos? É, pois, natural que um tal homem revista forma horrível e se manifeste com um verdadeiro luxo de odiosas transformações.
Convém recordar que a população desses abismos do Kamaloka se compõem da escoria da humanidade: assassinos, bandidos, criminosos de todo gênero, bêbados, libertinos; em uma palavra, tudo que há de mais vil no gênero humano.
Tudo o que aqui se encontra, com a consciência exata do que o rodeia, é culpado de algum crime brutal, de alguma crueldade persistente e deliberada. As únicas pessoas de caráter mais elevado que se encontram aí são os suicidas, homens que, pondo fim aos seus dias, quiseram escapar à punição terrestre dos seus crimes. Assim agindo não fizeram senão agravar sua situação.
Nem todos os suicidas, porém, aí se encontram, porque o suicídio pode ser cometido por motivos bem diversos. Aí não se encontram senão os que covardemente se matam para evitar os conseqüências de suas próprias ações.
Independentemente do ambiente lúgubre e dos companheiros abjetos que ali existem, o homem é por si mesmo, o creador imediato de sua própria miséria. Não tendo sofrido outra mudança, senão a perda de seu véu corpóreo, manifesta suas paixões com toda a sua faculdade original e sua brutal nudez. Cheios de apetites ferozes e insaciáveis, inflamados pela vingança, pelo ódio, pelas concupiscências, que não podem satisfazer, por falta dos respectivos órgãos, as almas erram, furiosas e ávidas, através desta morada sombria. Elas se reúnem em torno dos piores lugares da terra, nas casas de deboche onde campeia o vício, a embriaguez, excitando os concurrentes destes lugares aos atos mais vergonhosos e a ações violentas, procurando ocasião favorável para os obsedar e conduzi-los aos piores excessos. A atmosfera sufocante que existe em torno destes lugares é em grande parte devida à presença destas entidades ligadas à terra, possuídas de paixões abjetas e desejos infames. Os médiuns, a não ser que eles tenham um caráter puro e nobre, são principalmente objeto de seus ataques. Frequentemente falhos de vontade, debilitados pelo abandono passivo de seu corpo à ocupação temporária de outras entidades desencarnadas, são facilmente obsedados por estes seres mãos e arrastados à intemperança e à loucura. Os assassinos executados, possuídos de terror, de ódios, de vingança insaciável, renovam sem cessar seu crime por um impulso maquinal, reproduzindo mentalmente os acontecimentos terríveis que o seguiram, envolvendo-se numa atmosfera de formas-pensamentos do crime. Estas, atraídas para quem alimente tais sentimentos de ódio ou vingança, incitam a cometer o crime, em que o morto pensava. Ver-se-á, às vezes, nesta região, o assassino constantemente seguido de sua vítima, a cuja angustiosa presença não pode subtrair-se, forma inerte que persegue seus passos com uma persistência inelutável, apesar dos esforços que faz para desembaraçar-se dela. A vítima, a menos que não seja de caráter vil, é inconsciente do fato, e esta inconsciência mesmo parece aumentar, para o culpado, o horror desta perseguição infernal.
É aqui que também encontramos o inferno do vivisector, porque a crueldade atrai ao corpo astral os materiais mais grosseiros e as mais repugnantes combinações da matéria astral... E a alma vive cercada pelas formas de suas vitimas mutiladas, gemedoras, trementes, lançando gritos, vivificadas, não pelas mesmas almas dos animais, mas pela vida elemental fremente de ódio contra os sacrifícios. Este repete suas piores experiências com uma regularidade automática, consciente de seu horror, imperiosamente levado a infligir de novo este tormento pelo hábito contraído em sua vida terrestre.
Antes de deixar a região sombria recordemos, mais uma vez, que não há aqui punição arbitrariamente infligida pelo exterior; mas unicamente o efeito inevitável de causas postas em ação pela própria ação.
Durante sua vida física estes homens cederam aos impulsos mais vis; atraíram e assimilaram em seu corpo astral materiais que unicamente podiam vibrar em resposta a estes impulsos. Agora, este corpo que eles mesmos construíram torna-se a prisão de sua alma e deve cair em ruínas antes que ele possa evadir-se.
O bêbado é forçado a viver, aqui em baixo, em seu corpo físico repelente, abrasado pelo álcool? A mesma lei o forçará a viver, em Kamaloka, em seu corpo astral não menos repelente. Tudo o que se semeia, se colhe segundo sua espécie, tal é a lei em todos os mundos, e nada pode a isto escapar. Na verdade, o corpo astral não é lá nem mais horrível nem mais nauseabundo que no tempo em que o homem vivia ainda na terra, onde tornava a atmosfera fétida em torno de si, por suas emanações astrais. Mas na terra as pessoas não percebem esta fealdade; porque astralmente são cegas.
E quando consideramos estes infelizes que são nossos irmãos, podemos nos consolar pensando que seus sofrimentos são apenas temporários e dão à vida da alma uma lição de que ela tem necessidade. Sob a reação terrível das leis da natureza que violou, aprende que estas leis existem e mostram a conduta do homem. A natureza nada nos poupa, mas, no final de tudo, suas lições são excelentes, porque asseguram a nossa evolução e conduzem a alma à conquista da imortalidade.

Continua.

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