22.8.11

A MATEMÁTICA DE EINSTEIN E A MÍSTICA DE GANDHI

“Futuras gerações dificilmente acreditarão que um homem como Gandhi tenha passado pela face da terra, em carne e osso.”
Estas palavras escreveu Einstein sobre Mahatma Gandhi; e o governo da Índia teve a feliz idéia de reproduzir esta declaração no frontispício do magnífico álbum comemorativo do primeiro centenário do nascimento do libertador da Índia.
Em que se baseava esta entusiástica admiração que o maior matemático dos séculos dedicava ao maior místico dos nossos tempos?
Baseava-se na convicção, implícita ou explícita, de que o princípio da matemática é o mesmo princípio creador da mística.
Afirmar semelhante verdade perante inexperientes é merecer o título de louco ou utópico. E, no entanto, Einstein e Grandhi partiam do mesmo princípio matemático-metafísico. Ambos afirmam que pelo “puro raciocínio”, como Einstein chama a INTUIÇÃO, pode o homem descobrir toda e qualquer lei do cosmo; sem nenhum recurso à empiria dos sentidos nem à análise mental.
E que outra coisa é o satyagraha de Gandhy? Durante mais de meio século viveu aferrado ao princípio da Verdade, que identifica com Deus, a despeito de todo o ceticismo de seus conterrâneos; manteve-se inabalavelmente fiel ao “apego à Verdade” (satyagraha). Acreditava mais na força do espírito que no espírito da força; mais na alma que nas armas. E por isto fez preceder o satyagraha pelo ahimsa (não violência). Exigia de si e de seus companheiros absoluta e incondicional desistência de qualquer forma de violência, ahimsa integral – abandono de violência física (matança e ferimento), de violência verbal (insultos), de violência mental-emocional (ódio). Onde há violência não há Verdade e, como a Verdade é o único poder real, Gandhy exigia 0% de violência, a fim de conseguir 100% de Verdade.
Com esta arma secreta libertou ele o seu país de 150 anos de jugo estrangeiro. Talvez pela primeira e única vez na história da humanidade, um fator puramente espiritual produziu tamanho efeito material. Os profanos sabem que causa material produz efeito material. Os místicos sabem que causa espiritual produz efeito espiritual – mas quem está convencido de que uma causa espiritual produz efeito material?...
Que o grande místico, lá na longínqua Índia dos iogues, tenha professado esse princípio creador da intuição metafísica-mística, o mundo perdoará facilmente a um visionário oriental como Mahatma Gandhi – mas que esse princípio abstrato seja proclamado por um cientista ocidental como Albert Einstein – quem poderia aceitar?
Tenho diante de mim três livros, dois deles da autoria do próprio Einstein, e alguns escritos sobre o grande matemático. Os dois livros de Einstein são Mein Weltbild (Como vejo o mundo) e Aus Meinem Spaeten Jahren (Dos meus últimos anos).
Ora, através destes livros vai a constante afirmação de Einstein de que o “puro raciocínio”, como ele chama a intuição abstrata, pode descobrir qualquer lei da natureza, sem nenhum recurso a processos empírico-analíticos, nem de laboratório. Basta que o homem se concentre intensamente até atingir e ultrapassar toda a zona da sucessividade analítica e entrar na zona da simultaneidade da razão espiritual, e saberá como o UNO do UNIVERSO rege e governa o VERSO do cosmo.
É este o rpincípio dedutivo da matemática, e não o princípio indutivo da física; é o caminho a priori dos grandes metafísicos e místicos, e não o processo a posteriori dos cientistas empírico-analíticos.
Quando em 29 de maio de 1919, ocorreu o grande eclipse solar, estava Einsteins em Londres; A Real Sociedade de Ciências da Inglaterra mandou fotografar o sol totalmente eclipsado; um amigo de Einstein mostrou, triunfante, a fotografia, dando os parabéns ao grande matemático, porque o fato comprovava magnificamente uma importante tese matemática de Einstein. Este, porém, ficou indiferente, observando apenas”... Quem conhece dedutiva e intuitivamente, a priori, uma lei cósmica, não necessita de provas empíricas, indutivas, a posteriori, provas que não lhe podem dar nem tirar a certeza.
O metafísico e o místico não aceitam a Realidade (Deus) porque alguém a tenha demonstrado “cientificamente” – mas aceitam-na anterior e independentemente de qualquer prova ou demonstração, porque têm a fonte de certeza dentro de si mesmo, no seu centro e cerne, no eterno UNO do seu Eu intuitivo. E, como nenhuma prova factual (e fictícia) lhes pode dar certeza, também nenhuma prova lhes pode tirar.
Eu penso 99 vezes, diz Einstein, e nada descubro; deixo de pensar e eis que a certeza me é revelada. Por onde se vê que ele considera o pensamento analítico necessário como preliminar, mas não suficiente para o resultado final.
É este o caminho de todos os metafísicos e místicos – desde Hermes, Sócrates, Platão e Spinoza, até Jesus, Tagore, Maharishi e Gandhi – todos eles sabiam e sabem que a atividade ego-consciente, empírico-analítica, é necessária, mas que não é suficiente para uma certeza definitiva.
É necessário entrar em contato intuitivo com o UNO da Realidade, a fim de poder compreender o VERSO das facticidades. Não há nenhum caminho diz Einstein, que do mundo dos fatos conduza ao mundo dos valores, porque estes vêm de outra região.
Valor é sinônimo de Realidade. Ninguém vai das facticidades à Realidade; é necessário que primeiro conscientize a Realidade do uno, PARA DAÍ DESCER ÀS FACTICIDADES DO Verso. É necessário ter experiência intuitiva, direta, da qualidade (Uno) a fim de compreender as quantidades (Verso). As facticidades quantitativas são necessárias como condições pré-disponentes, mas não são suficientes como causa eficiente. E, sendo que só o contato com a causa eficiente dá verdadeira certeza, segue-se que o homem deve, em primeiro lugar, ter nítida consciência da causa, da Realidade, do Uno, para poder compreender os efeitos, as facticidades, o Verso – só assim sabe e saboreia a harmonia do Universo.
Pode a ciência preludiar a sapiência, mas não a pode dar nem substituir.
A ciência é da física, a sapiência é da matemática, bem como da metafísica e da mística.
O homem inexperiente, empírico-analítico, acha que deve começar pelos fenômenos objetivos, externos, e daí subir até a Realidade, causa dessas facticidades. Mas o homem experiente sabe, como Einstein, que este caminho não é transitável e não passa de um eterno círculo vicioso; é como se alguém lidasse com muitos zeros – 000 000 000 – para chegar ao valor positivo “1”; não existe nenhum processo de adição ou multiplicação de zeros para crear o “1”; mas quem parte do “1” pode descer aos zeros, e verá que esses zeros deixam de ser nulidades e vacuidades, porque são agora desnulificados pelo fator positivo “1”: 1.000.000.000. Todas estas vacuidades dos zeros são plenificados pela plenitude; a qualidade do “1” confere quantidade aos “000”; a Essência dá conteúdo à inexistência, e resulta a existência; o Todo dá algo de si ao Nada, e o Nada se faz Algo,.
Quando Moisés, Elias e Jesus passaram quarenta dias em silêncio e solidão; quando Francisco de Assis se isolou por meses seguidos cume do monte Alverne; quando Paulo de Tarso, após sua queda às portas de Damasco, mergulhou por três anos nas estepes da Arábia; quando Tagore, Maharishi e Gandhi se envolveram em profunda solidão – que outra coisa fizeram eles senão fechar os canais de fora para que a fonte de dentro rompesse?
Quando Einstein, partindo de um princípio puramente matemático, diz que pelo “puro raciocínio” pode o homem descobrir as Leis do Universo, afirma ele a mesma verdade, mas não nos diz, geralmente, o que devemos fazer para despertar em nós a fonte da certeza.
Para esse despertamento é necessário que o homem se entregue a um longo período de silêncio auscultativo – silêncio mortífero para o ego-empírico-analítico, mas vivificante para o Eu metafísico-místico-matemático.
Parece que a elite da humanidade, neste ocaso do segundo milênio, está abrindo os olhos para esta grande verdade, preludiando, possìvelmente, uma humanidade mais sadia e mais feliz.

Huberto Rohden.

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