19.8.11

OS SANTOS MODERNOS

Era natural e característico que nestas condições a Índia procurasse consolo na religião. Por um tempo deu ela cordial acolhida ao cristianismo, no qual encontrou muitos ideais éticos que ela já honrava de milhares de anos; e “antes que o caráter, e a conduta dos europeus,” diz o padre Dubois, “se tornassem conhecidos dos indianos, pareceu possível a expansão do cristianismo na Índia.” Durante o século 19º os missionários cristãos procuraram fazer a voz de Cristo ouvida nos intervalos dos canhoneios; montaram e equiparam escolas e hospitais, deram ao povo teologia misturada com medicina e pela primeira vez surgiu nos párias a idéia de que eles também eram criaturas humanas. Mas o contraste entre os preceitos cristãos e a prática dos cristãos, tornou os hindus cépticos e irônicos. Observavam eles que a ressurreição de Lázaro era indigna de nota; as religiões indianas tinham coisas muito mais milagrosas que essa; além disso, qualquer yogi de hoje faz milagres, ao passo que os do cristianismo já se acabaram. Os brâmanes sustentaram galhardamente o terreno, e contra as ortodoxias do Ocidente ofereceram um sistema de pensamento igualmente sutil, profundo e incrível. “O progresso do cristianismo na Índia,” diz Eliot, “foi insignificante.”
Não obstante, a fascinadora figura de Jesus tem tido muito mais influência na Índia do que a que pode ser medida pelo fato de o cristianismo só ter em 300 anos conquistado 6% da população. Os primeiros sinais dessa influência aparecem no Bhagavad-Gita; os últimos evidenciam-se em Gandhi e Tagore. O mais claro exemplo está na reforma conhecida como Brama-Somaj, lançada em 1828 por Ran Mohun Roy. Ninguém podia aproximar-se do estudo da religião com mais consciência. Roy aprendeu sânscrito para ler os Vedas, aprendeu o pali para ler o Tripitaka do budismo, o persa e o árabe para estudar o Corão, o hebreu para conhecer o Velho Testamento e o grego para conhecer o Novo. Em seguida estudou inglês e escreveu com tanta facilidade e graça que Bentham desejou que James Mill se aproveitasse do exemplo. Em 1820, Roy publicou seu Preceito de Jesus: Guia da Paz e da Felicidade, e anunciou: “Encontrei as doutrinas de Cristo mais conducentes a princípios morais e mais bem adaptadas ao uso dos seres racionais do que qualquer outra que me tenha chegado ao conhecimento.” E propôs aos seus escandalizados conterrâneos uma nova religião sem politeísmo, sem castas, sem poligamias, sem casamento infantil, sem suttee (a viúva que se sacrificava na pira funerária do marido) e sem idolatria – só com deus, Brahman. Como Akbar, sonhou que toda a Índia se unisse num só credo assim tão simples; e, como Akbar, não levou na devida conta a popularidade da superstição. O Brama-Somaj, depois de cem anos de luta, é hoje uma força à margem da vida indiana.

Da Obra História da Civilização Volume III
Autor Will Durant

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