6.2.11

OS ANTIGOS MISTÉRIOS - PARTE 2/3

Numerosos papiros e inscrições murais demonstram a intensidade com que os primitivos egípcios reverenciaram o rito de Osíris, e revelam o temor dos nativos ao mirar aqueles a quem se permitia penetrar nos santuários reservados e nas criptas consagradas, onde se realizavam as fases mais sagradas do ritual secreto. Havia o grau supremo e final de iniciação, em que as almas não eram simplesmente desprendidas dos corpos mergulhados na morte aparente, para provar a verdade da sobrevivência depois do grande traspasse, mas eram levadas às esferas mais altas do ser, ao reino mesmo do Criador. Nessa maravilhosa experiência, a mente finita do homem se punha em contato com a Mente Infinita da sua divindade superior. Era-lhe dado entrar, por um breve instante, em silenciosa e magnânima comunhão com o Pai Nosso, e esse fugaz contato de êxtase indizível era suficiente para lhe mudar toda atitude para com a vida. Havia comungado com o elemento mais santo que existe no ser, descoberto um raio inefável da Deidade do seu verdadeiro e recôndito Eu, de cujo corpo a alma que sobrevive à morte é apenas uma roupagem intangível. Verdadeiramente, e de fato, havia nascido de novo no mais elevado sentido da palavra. O iniciado dessa forma tornava-se Adepto perfeito e, segundo o que dizem os hieróglifos - podia esperar os favores dos deuses durante a vida e o estado de paraíso depois da morte".
Essa experiência era vivida em transe, ainda que exteriormente se assemelhasse ao transe hipnótico empregado nos primeiros graus da iniciação, mas era fundamentalmente distinta. Nenhum poder hipnótico lha poderia conferir, nenhuma cerimônia mágica jamais lha poderia evocar! Somente os supremos hierofantes, unidos às suas divindades, e suas vontades fundidas com a sua, poderiam, com sua tremenda fôrça divina, tornar o candidato consciente da sua natureza superior. Esta foi a revelação mais nobre e mais impressionante que foi acessível ao homem egípcio, e ainda hoje o é ao homem atual, embora por outros métodos e diversos caminhos.
A experiência da iniciação era uma reprodução em miniatura da experiência destinada a ser vivida por todo o gênero humano através dos processos da evolução. A única diferença é que, como a primeira é uma conquista forçada, era obtida pelo crescimento rápido, um processo artificial como o transe, enquanto que o desenvolvimento psíquico e espiritual deve se processar naturalmente.
A experiência refletia dentro da alma todo o drama da evolução humana e o iniludível destino do homem.
O princípio em que se baseavam as experiências era que a natureza física do homem podia ser paralisada temporariamente mediante profundo sono letárgico, e sua natureza psíquica, habitualmente latente, podia ser despertada por um processo conhecido só pelos hierofantes. Visto por qualquer observador, o homem induzido artificialmente ao estado de coma pareceria na realidade morto. Com efeito, na linguagem simbólica dos Mistérios, dir-se-ia que "tinha descido na tumba" ou "sepultado na cova". Privado dessa maneira da sua vitalidade, o corpo, as forças das suas paixões e desejos pessoais estão temporariamente adormecidos; o candidato fica realmente morto para todas as coisas mundanas, enquanto a sua consciência, seu ser anímico, se separa da carne. Só nesse estado era possível ao homem perceber o mundo espiritual tal como é percebido pelos próprios espíritos - ter visões dos deuses e anjos, pairar no espaço infinito - conhecer seu mais recôndito ser e ... finalmente, o DEUS VERDADEIRO.
Este homem pode dizer com razão que esteve morto e ressuscitou, pois simbólica e literalmente esteve dormindo na tumba e passou pelo milagre da ressurreição, acordando para nova compreensão do significado espiritual da morte e lembranças da vida divina que palpita no seu coração. Trazia consigo os estigmas do hierofante que havia produzido essa inesquecível experiência e, depois, os dois ficavam unidos para sempre por laços inquebrantáveis, íntimos e profundos. A doutrina da imortalidade da alma já não era uma simples doutrina; era um fato comprovado, demonstrado sem reservas ao iniciado. Ao despertar à luz do sol, podia dizer com absoluta certeza que tinha regressado ao mundo, totalmente transformado e renascido espiritualmente. Havia passado por céus e infernos e conhecido alguns dos seus segredos, porém também, daí por diante, a ajustar sua vida e conduta ao conhecimento de que esses dois mundos existem realmente. Transitava pela vida, ciente e seguro da imortalidade da alma, pondo em reserva as fontes em que havia bebido; mas, mesmo inconscientemente, não podia deixar de transmitir aos seus semelhantes sua certeza, renovando-lhes a fé mediante misteriosa telepatia inconsciente que sempre circula entre os homens. Não acreditava na morte, mas sim, na Vida, vida perene, auto-existente e sempre consciente. Acreditava naquilo que o hierofante havia descoberto nos resguardados retiros do templo; descobrira que existe a alma oriunda do raio do sol central, Deus para ele. A história de Osiris havia adquirido um sentido pessoal. Ao descobrir o próprio renascimento, descobrira Osiris que era o seu próprio ser imperecedouro.
Essa foi a verdadeira doutrina do sagrado texto mais antigo do Egito, O LIVRO DOS MORTOS que, todavia, em sua presente forma conhecida, é uma mistura de papiros referindo-se a mortos e mortos-vivos - os iniciados - e daí ser um tanto confuso. Que primitivamente, em sua forma original e intacta, pertenceu aos Mistérios, prova esta passagem: É um livro de um mistério supremo - que não o veja os olhos de nenhum homem (profano); seria abominação. Ocultai sua existência. Chama-se "O LIVRO DO MESTRE DO TEMPLO SECRETO".
Essa é a origem de que os defuntos (na realidade os iniciados) antepunham aos seus nomes o nome de Osiris, fato freqüentemente repetido no LIVRO DOS MORTOS. Nas primeiras versões dessa obra antiga, os defuntos diziam de si mesmos: "Eu sou Osiris". "Tornei-me como tu, vivo como os deuses", justificando dessa maneira a interpretação atual de que, morto, Osiris era na realidade o iniciado, o mergulhado em transe similar à morte.
Assim como no papiro de Nu ilustrado com pitorescas vinhetas, exclama um iniciado triunfante: "Sim, eu também sou Osiris. Tornei-me glorioso. Sentei-me na câmara de nascimento de Osiris, e nasci como ele. Abri a boca dos deuses. Sentei-me no mesmo lugar onde ele se senta".
Eis aí mais uma passagem de outro papiro do LIVRO:
"Elevei-me a Deus Venerado, o Mestre da Grande Morada".
Assim era a instrução recebida nos Mistérios, instituição tão prestigiada na antiguidade, e tão depreciada nos tempos modernos.
Podemos, pois, compreender o verdadeiro intuito das antigas religiões, se compreendermos também que seus heróis personificam a alma humana e suas aventuras representam experiências da alma em busca do Reino do Céu.
Osiris tornar-se-ia, então, a imagem do elemento divino do homem, e a história simbólica desse elemento está na sua descida ao mundo da matéria e sua reascensão à consciência espiritual.
Seu lendário retalhamento em catorze ou quarenta e dois pedaços simbolizava o atual desmembramento espiritual do ser humano, cuja harmonia de outrora foi quebrada. Sua razão foi divorciada de seus sentimentos, e a confusão e os propósitos desencontrados o jogaram de um lado para o outro. Assim, também, a história de Isis que, recolhendo os fragmentos esparsos do corpo de Osiris e renovando-lhe a vida, simbolizava a reintegração, primeiro, pelos Mistérios e, mais tarde, pela evolução da natureza belicosa do homem à perfeita harmonia, harmonia em que o espírito e o corpo se movem de comum acordo e a razão corre paralela aos sentimentos. Era o retorno à primordial unidade.
A doutrina suprema dos egípcios, o fundamento teórico dos graus superiores da iniciação, dizia que a alma deve voltar finalmente ao Ser Divino que a irradiou e, referindo-se ao regresso, falava "tornar-se Osiris". Considerava, portanto, que o homem, embora sujeito às leis da terra, era potencialmente Osiris. No manual secreto da iniciação, o LIVRO DOS MORTOS, admoesta-se a alma desprendida do candidato a proteger-se em suas grandes e perigosas viagens supra-terrestres, não só usando os amuletos, como também clamando com ousadia: "Eu sou Osiris"!
"Ó alma cega! - disse a mesma Escritura Sagrada - "apanha a tocha dos Mistérios e poderás na noite terrena vislumbrar teu duplo luminoso, teu Divino Ser. Segue esse guia celestial e ele será o Gênio, que possui a chave da tua existência passada e futura".
Por conseguinte, a iniciação equivalia a receber uma nova visão da vida, a visão espiritual que o gênero humano perdera num passado remoto, quando da sua "queda" do "paraíso" na matéria. Os Mistérios eram um meio, uma possibilidade de reascensão interior gradativa ao estado perfeito - à iluminação. Revelavam aqueles mundos misteriosos do Além do umbral da matéria e, posteriormente, o maior de todos os mistérios: a própria divindade do homem.Mostravam ao candidato, os mundos infernais tanto para por à prova seu caráter e sua resolução quanto para instruí-lo, e lhe abriam os mundos celestiais para animá-lo e rejubilá-lo. E se recorriam ao transe, não quer dizer que não havia ou não haja outros métodos; apenas era um processo que eles usavam, porém o Reino pode ser conquistado por outras vias; não é obrigatório que seja o transe.
Qual de nós está em condições de repetir as nobres palavras de um iniciado filósofo romano que disse: "Onde nós estamos não há morte - onde existe a morte lá não estamos. É a última e a maior dádiva da natureza, porque liberta o homem de todos os entraves e, no pior dos casos, é o fim do banquete que temos gozado".
Nossa atitude perante a morte subentende nossa atitude perante a vida. Os Mistérios mudavam a atitude do homem para com a morte, porquanto alternavam sua conduta de vida. Demonstravam que a morte não é mais do que o anverso da moeda da vida.
As investigações científicas, psíquicas e psicológicas estão mudando a atitude do mundo ocidental que, antes, considerava certos assuntos como irracionais e tolos. Essas pesquisas estão libertando as idéias dos antigos do desmerecido desdém em que jaziam, enquanto os outros conceitos mais jovens apareciam e desenvolviam sua virilidade pujante. Estamos começando a perceber quão sadias eram as idéias aparentemente insanas dos antigos. A prova da existência das forças imateriais sobressaltou nossa era agnóstica. Nossas sumidades científicas e os grandes pensadores estão se unindo às fileiras dos que crêem que a vida tem uma base espiritual. E o que eles estão pensando hoje, amanhã pensarão as massas. Começamos e, talvez com razão, depois de totalmente descrentes, a ser crentes fervorosos.
A primeira grande mensagem dos antigos Mistérios - NÃO EXISTE A MORTE - ainda que seja sempre susceptível de prova pessoal da experiência para poucos, está destinada a ser difundida para o mundo inteiro.

Nenhum comentário:

Postar um comentário